Prisão de ventre

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

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Estou com uma prisão de ventre de criatividade. Todos os dias eu entro no blog, paro e penso, mas essa maldita tela branca funciona como uma espécie de trava psicológica, me deixa tenso, a criatividade parece não fluir. às vezes gostaria que ela fosse preta, ou azul, talvez fosse mais fácil. Acho que o azul é a cor que deixa a criatividade fluir, sei lá... Não consultei o Feng-Shui. Hoje, no entanto, resolvi que aqui entraria e faria minha sessão-psicólogo, não dando a mínima pra qualidade ou o que viesse a sair. Foda-se. Viu? EM situações normais eu não usaria um palavrão assim, solto, do nada. EU acho isso arte chula, uma facilidade de humor muito mesquinha. Os palavrões podem ser usados como ferramentas para o humor, mas se muito bem colocados.
Enfim, do que eu estava falando? Ah, sim, da minha prisão de ventre. Não vou ao banheiro desde domingo. Talvez por isso eu esteja hoje um tanto irritado. Acordei assim. Não sei exatamente porque, acho que um dia sem visitar o trono não pode causar tanto mal assim. O fato é que estou irritadiço. Olho pro facebook e ele me dá nojo. Olho pra minha mão e ela me dá nojo (isso talvez seja porque eu acabei de ariar uma panela tensa e ela esteja preta). Olho pro meu quarto e ele me irrita profundamente. Pra que tão branco, porque tão vazio e silencioso? Está faltando umas esculturas aqui e ali pra dar um clima mais decorativo. Falta também alguma arte na parede, nem que seja uma cor de contraste com o branco. E essa maldita cadeira que está desconfortável? ARGH estou um nojo hoje, não estou bom mesmo. Prefiro até evitar um certo contato humano pra evitar ferir alguém, mas na solidão acabo me fechando e me tornando cada vez mias chato. E começou de repente, estava muito bem, mais que bem bem bem na casa da minha avó hoje mais cedo. Talvez tenha sido o angu a baiana que eu comi. Me deixou meio sonolento. EU sou um porre com sono.
Enfim, não sei se é a prisão de ventre criativa, fecal ou se foi o angu. O fato é que estou estressado e irritadiço hoje, não sou a melhor companhia pra um papo casual hoje. Não sei porque. Pouco me importa. O dia está quase acabando mesmo...

Capítulo 1 de Pecado

terça-feira, 2 de agosto de 2011

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É, um desses projetos que a gente começa e o tempo não deixa a gente acabar...
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Estava tudo acabado. Era o fim do jogo. Era o fim de sua vida. Essa era a conclusão a que ele chegara assim que começara a correr pela floresta, pois não seria capaz de conviver com sua própria consciência após aquele dia. Definitivamente, estava tudo acabado, era só uma questão de aceitação.
Se não estivesse correndo tão rapidamente, provavelmente sua camisa estaria se movimentando, tamanha a intensidade das batidas que embalavam seu coração naquele momento. O vento soprava fortemente seu rosto, lhe tirando o ar, lhe gelando a face com sua frialdade digna da própria morte, que, aliás, parecia permear em sentido todas as dimensões daquela floresta, como um animal, cercando ao mesmo tempo feroz e calculadamente sua presa. E a presa corria. E corria rápido. Muito rápido. Seus pés, ao mesmo tempo em que impulsionavam fortemente o seu corpo, pareciam mal tocar o chão abaixo de si, como se o chão houvesse se tornado uma esteira rolante que girava rapidamente, fazendo com que os galhos secos, as folhas putrefatas e os pedaços de tronco caídos ao chão não passassem de borrões disformes, bem como toda a floresta ao seu redor. Constantemente os galhos mais afiados prendiam-se a sua jaqueta, rasgando-a em diversos pontos à medida que ele tentava desviar dos obstáculos rapidamente. Às vezes abaixava-se, às vezes era necessário pular um tronco caído, ou apenas desviar-se para o lado quando um galho se erguia em sua direção como dedos afiados e malignos, tentando prendê-lo ali naquele local. Tentando prendê-lo à floresta. Tentando prendê-lo à morte.
Sua respiração era ofegante, rápida, descompassada. Corria no meio do borrão disforme da floresta, sem saber aonde ir, nem onde estava. Corria no nada, em direção ao nada, um ponto perdido no espaço-tempo sem qualquer relação com um futuro mais distante que o próximo segundo. Ele não era nada naquele momento. Seus olhos estavam vermelhos e seu rosto estava encharcado pelas lágrimas que brotavam em seus olhos como uma mina de água, explicitando inúmeras características que faziam de seu rosto a perfeita representação da palavra desespero. Não o desespero vulgarizado pelo cotidiano: o desespero real, a sensação de que sua vida acabou, de que será impossível continuar, impossível prosseguir. O grande abismo do fim e encontra a milímetros de seus pés, e seu fundo é tão escuro, tão aterrador e tão indefinido...
Um grito ecoou pela floresta. Era um grito desesperado de dor, de agonia, vindo de algum lugar atrás dele. Pela intensidade do som, poder-se-ia dizer que a mulher que o proferia estava ao pé de seu ouvido, mas ele sabia que não: ela estava a muitos quilômetros atrás. Isso dava um tom ainda mais trágico à situação: ela gritava alto, muito alto. Provavelmente estava sentindo as piores sensações que jamais sentira antes, experimentando novos e refinados tipos de tortura física, psicológica, total. Seu grito era contínuo, mas desafinava com a intensidade ao longo do período. Ele era intenso, representava a dor, o desespero, o sofrimento e ao mesmo tempo a súplica implícita para o fim, o terrível e único fim possível. O fim de tudo, o fim da dor, o fim do sofrimento, simplesmente o fim. O grito o atingia fortemente. Continuava correndo, mas agora parecia que o aperto que já sentia no coração aumentara, tornara-se físico, real, como se aquele grito longo, agonizante fosse capaz de evocar uma mão demoníaca que apertava-lhe o coração com suas mãos ácidas. Suas lágrimas, que ele pensava ser impossível tornarem-se mais intensas, haviam triplicado com o grito continuado. Agora ele parecia estar suando em bicas, apesar do frio ártico que fazia ali fora, entre as árvores.
De repente, o grito cessou, quase tão abruptamente quanto ele começou. O grito parou, a mulher morrera. Morrera. Aquela constatação viera imediatamente. Era lógica. Era não só possível, como certa, definitiva e aterrorizantemente concreta. O fim do grito funcionara nele como o fim da energia para um aparelho robótico. Suas pernas diminuíram de ritmo, suas passadas se tornaram mais curtas, gradativamente. O desespero e a dor atingiram níveis tão extremos que passaram a se tornar demasiado intensos para sua mente. Antes, ela tentava registrar as sensações e o momento. Agora, ela estava vazia, oca, como se a floresta houvesse desaparecido juntamente com o grito, como se seus pés agora tocassem no nada. Ele estava perdido no vácuo, no escuro, no vazio da perda. Quando enfim suas pernas tentaram dar um último e derradeiro passo, sua estrutura fraquejou. Caíra de joelhos sobre uma pilha de folhas secas e gravetos apodrecidos. Suas mãos pendiam ao seu lado, como anexos mortos a um corpo que não mais tinha alma. O fogo que alimentava sua alma apagara, como se o vazio e o silêncio triste da floresta fossem um sopro frio de morte sobre a chama da vida. Seu corpo vazio pendera como um animal abatido ao chão. Estava tudo acabado. Era o fim da vida dela, e era tudo sua culpa. Tudo!
A constatação chegou ao seu coração como se a mão demoníaca que ali estava desse seu golpe final: apertara-o com tanta intensidade que seu coração desistiu de tentar resistir. Parou, cansado de lutar, cansado de tentar. O sangue se esvaiu de seu rosto como se fosse drenado por um tubo aos seus pés. Como último pensamento, estava lá o remorso que o corroia, que o destruía por dentro. Era culpa sua.
Uma última lágrima desceu de um de seus olhos, já cegos pelo véu da morte. Cegos pelo véu de muitas mortes.